sábado, 31 de maio de 2025

meu luto

vivo no modo automático
até que uma música toca

e capota um carro no meu coração

você renasce nos objetos calados:
a caneca rosa com olhos de coruja
me espia da prateleira
o tapete ainda se enrola na sala
aquele que você odiava
e eu mantive
só por teimosia

E aquele jogo americano listrado

Chato de lavar, chato de guardar

sempre molho tudo

inclusive meu short

noite quente em santos
abri as janelas
e fui deitar
a sombra da árvore
brinca fora de hora no teto

logo adormeci,
até que um barulho me trouxe de volta
jurei que foi a geladeira estalando
mas lá no fundo, desconfiei de você
na dúvida, deixei a luz da cozinha acesa









sexta-feira, 17 de maio de 2024

Chove Chuva

gotas em queda livre

despencam do céu

mergulham em mim

plantas mudam de cor,

água escorre de folha em folha,

pingos acumulam no para-brisa.

meus óculos embaçam,

enquanto corro

inutilmente para não me molhar.

a imagem difusa se ilumina,

poças nascem,

guarda-chuvas desabrocham nervosos

chego em casa aflito

pingando, com o coração ensopado.

terça-feira, 7 de maio de 2024

Profecia 2.0

nelson chegará em 2 minutos

avisa o uber.

quarta-feira, 17 de abril de 2024

inferno surrealista

prédios e suas varandas vazias

envidraçadas

lá de cima é possível ver

de um lado o brooklin

do outro, o campo belo

logo abaixo,

carros atravessam

o mar de asfalto congestionado

e de uma avenida, surgem outras avenidas e mais outras,

nasce uma rodovia, uma ponte

uma obra megalomaníaca de um monotrilho

E no meio dessa construção

vivem quatro famílias


cobertor pendurado na grade, 

papelão, saco plástico

sofá rasgado, cachorro

colchão, fogueira, panelas

e no meio dessa tragédia social

um bebê sem camisa

enfia um biscoito recheado inteiro

na boca


seis  horas em ponto

o trânsito pontualmente paralisa

de patinete elétrico, óculos escuros e sapatenis

um faria limer atravessa o congestionamento

e de repente, as janelas se acendem

piscam

ficam coloridas

decoração de natal

na avenida roberto marinho

o bebê surpreso 

numa explosão de alegria

solta uma gargalhada

e deixa o biscoito cair




terça-feira, 26 de março de 2024

uma gota carrega tanta coisa

lágrima é a materialização física do abstrato

extrato concentrado de tristeza saturada

escorre pelos olhos feito tobogã

desliza pelo rosto e despenca

carregando consigo parte dessa saudade









sábado, 10 de fevereiro de 2024

bom dia!

enquanto o mar 

se alonga nas areias

os prédios de santos

reclamam em silêncio 

de dor no ciático


o mar trouxe de presente

uma concha

mas os prédios

só queriam

um tandrilax


acampado no jardim

o mendigo dorme

passarinhos, borboletas

a manhã parece tranquila

até chegar o calor

sol grita no céu

surgem pessoas

carros

cachorros

crianças

bicicletas


vendedores ambulantes gritam:

"olha o queijo coalho!"

" a sogra morreu ajuda eu!"

disse o vendedor de empadas


sirene, carro de polícia

carrinho de bebê, mosquitos

pombas, frescobol

o calor se intensifica

e o mendigo dorme






segunda-feira, 25 de dezembro de 2023

Mus(eu)

imagine um louvre inteiro

só sobre você

com exposições permanentes

e outras itinerantes


no fundo

somos um museu desorganizado

de nós mesmos

no meu caso um acervo 

de 41 anos sem curadoria


ramificações me conduzem 

por galerias de momentos

abro uma porta

e minha avó

saltitante

está fazendo biscoitos 

no outro corredor

meu pai toca piano

a sala treme blues


passei por memórias

de uma viagem  para búzios

na mala do paraty


no outro salão

esculturas tortas

pinturas de um amor

inacabado


ruínas de uma infância

de um ego detonado

lembranças engasgadas

de repente o coração acelera

dispara!

pânico!

olho para os lados

em busca de


SAÍDA DE EMERGÊNCIA

todo museu que se preze

tem que ter um fuga

a porta se abre

e um divã

vivi? 

minha psicanalista

a minha espera

cinquenta minutos depois

e mais questões surgem

ela encerra com um clichê

"nos vemos na próxima quinta?"


mais calmo ou não

volto para o museu

retorno ao mergulho para dentro de mim


escadas rolantes no museu?

saí do louvre e entrei no pompidou

minha vida virou instalação interativa

google fotos na parede

revelam vídeos, stories, 


esse mergulho interno

é a vontade de fazer um boomerang

só de ida

e ver você entrar pela casa

falando mais que o homem do gás

e a noite acabar numa concha

numa realidade aumentada




caleidoscópio

versões simultâneas, múltiplas, invertidas

perspectivas por todo lado

tropeço em lembranças


museu de uma vida inteira

museu de uma vida só

frequentado por um único visitante

um observador de si mesmo

reflete sobre o quão louco

e absurdo é estar aqui.


com essa reflexão vou parar numa lojinha?

tudo é sobre mim?

esses museus sempre acabam em lojas

são souvenirs da minha vida

minha fita k7 preferida, uma réplica do meu walkman

o cobertor azul bolinhas brancas!

uma miniatura da beliche vermelha que eu eu maria dormimos

meus livros de poemas

minhas bermudas hot stuff

Minha coleção de pedras! 

lápis com frases, apelidos que só fazem sentido para mim

desenhos? quem vai querer comprar esses desenhos?

quem vai querer comprar essas coisas?

Eu, talvez!